A Blogueira Convidada dessa semana é Sut-Mie Guibert do blog
Viajando com Pimpolhos.
Sui-Mie é francesa, filha de chinesa, casada com um brasileiro. Aqui ela conta um pouquinho do "outro lado da moeda" de como uma estrangeira se adapta a nossa cultura.
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O outro lado da história: o Brasil com um olhar francês by Sut-Mie
Quando a Paula me pediu para escrever em seu blog sobre esse assunto, fiquei bastante lisonjeada e com um frio na barriga! A responsabilidade é enorme, o NYwithkids em si já impõe respeito e quem segue e viu o nível das outras blogueiras convidadas, há de me entender! Mas ao mesmo tempo é um belo exemplo de troca cultural e digital, que hoje em dia, não deixa de ser uma nova cultura! Por isso topei na hora!
Para a historinha, eu sou francesa, nascida em Madagascar, de mãe chinesa e pai francês; morei em vários países desenvolvidos ou não, e passei uma parte da infância no Brasil, em Salvador, o que fez a diferença e me fez querer voltar após a faculdade. Por favor, não vamos fazer cálculos indiscretos, mas digamos que cheguei aqui aos 25 anos.
O intuito aqui é falar sobre as diferenças culturais, porque a Paula achou que eu fosse uma pessoa adequada para falar desse assunto. Mal sabe ela que eu sou a mais brasileira das francesas, ou a mais francesa das brasileiras! Em outras palavras: sou apaixonada pelo Brasil, por isso escolhi morar aqui, casei aqui e agora tenho uma filha brasileira! Ufa! Finalmente consegui dar um jeito e ter o Brasil no sangue, poder dizer que algo meu é realmente daqui!
Mas óbvio que além da paixão pelo país, as diferenças culturais existem, não seria a vida tão rica, pois as diferenças é que deixam tudo mais colorido, concordam? Imaginem se fossemos todos iguais? Ai, que tédio!
E é dessa forma que, às vezes, ainda me surpreendo aqui com a falta de pontualidade, com a falta de compromisso em certas situações, com a facilidade com a qual te mandam ligar e aparecer em casa...gente, eu sou literal (e nessas horas, francesa): se me disser para ligar ou aparecer, eu VOU aparecer! Pode me esperar! Nunca entendi porque me falam uma coisa se é para eu fazer o contrário? Então porque me falam isso? Bref. (expressão francesa = enfim...)
Além disso, nas coisas importantes, é obvio que fico muito chocada pela desigualdade, pela corrupção, pelas leis que servem mais para uns do que para outros...mesmo se sei que não é necessário ser estrangeira para ter esses sentimentos, e que a corrupção existe em qualquer lugar, mas na Europa, você se sente mais resguardado pelas leis, você denuncia, você vê colarinhos brancos caírem. Aqui, muitas vezes e infelizmente, as coisas acabam em pizza, como dizem!
No que diz respeito à maternidade especificamente, tive algumas surpresas, descobri acessórios que não existem na França, tipo “paninho de boca”, “de ombro”, toalhas fraldas (toalhas com um segundo pano por dentro, como uma fralda, para não “arranhar” a pele do recém nascido), cueiros e outras “cositchas mas”. E vou emitir agora uma opinião bastante pessoal, que, certamente, dará vazão a discussões, mas espero que entendam que não é um julgamento de valor, e sim, uma constatação feita por olhos estrangeiros, mas às vezes, penso que existe um certo exagero aqui: as crianças são super protegidas, consideradas frágeis, colocadas em pedestais. Durante a minha gravidez cheguei a pensar que era inexperiente, mas não incompetente ou incapaz, de tanto que todos davam pitacos, queriam ajudar na maior das boas intenções, porém a ponto de eu achar a coisa um pouco invasiva e que estavam me protegendo demais! É claro que o carinho, a atenção e o calor humano foram importantes nesse período e esse é um grande diferencial com a Europa, e é por isso que eu optei por morar aqui, mas o excesso, talvez cultural, acaba te limitando: “você não pode fazer isso”, “o bebê não pode fazer aquilo”...e, assim, vamos caminhando para a fragilidade.
E sinto isso até nas viagens, onde muitas vezes os pais acabam deixando de viajar porque acham que a criança não vai agüentar, não vai se adaptar, não vai comer, a mala para levar vai ser muito grande...(será que são as origens latinas melo dramáticas?!). Enfim... Daí a minha vontade de literalmente desdramatizar isso tudo e mostrar que é possível (e prazeroso!) viajar com crianças!
Tenho, assim, uma tendência a deixar tudo mais prático, e nessas horas, voltam as minhas origens francesas. Existe um lado europeu que eu gosto bastante, que é a “praticidade materna” de lá, com mil acessórios para facilitar a vida, até porque muitas vezes não têm empregada ou babá. Este fato tem conseqüências que eu enxergo como positivas, com pais mais envolvidos porque têm que ajudar e crianças mais independentes, que conseguem fazer várias coisas sozinhas. Claro que não concordo com eles a ponto de terem seus filhos fora de casa aos 16! Nessas horas, dou meia volta e prefiro me sentir mais “brasileira”, com sua cultura familiar e matriarcal!
Por isso é tão gostoso! No fundo, navego entre essas duas culturas, às vezes mais para lá, às vezes mais para cá, sabendo que sou, na verdade, uma privilegiada por ter diversas origens e poder transitar por elas, podendo assim buscar o melhor de cada uma! Porque não existe uma melhor do que a outra, e sim, cada uma com suas especificidades e vamos combinar que cada mãe sabe de sua família, não é mesmo?!
Hoje a minha grande preocupação é transmitir essa cultura e essa oportunidade para a minha filha: tento falar-lhe somente em francês (é super difícil se policiar em um país estrangeiro!), ler-lhe histórias, DVDs, CDs com músicas em francês. Ela entende tudo e fala um pouco, mas claro que se expressa muito melhor em português! Agora, só com tempo e persistência!
Obrigada pelo espaço Paula e espero não ter provocado nenhum choque cultural!"